

o que cabe na lágrima?
No gosto desse pingo de água salgada
um vale do choro para abrigar as vozes, os traços, os gestos, as texturas, as refrações e os reflexos de um corpo simbiótico navegando pelas sonoridades de uma correnteza amniótica
o choro entre o riso e o grito
se articula com outras canções de ninar
a fragilidade suspensa por um fio
impressa no vidro na luz
e na sombra
no espelho
e na parede
evocação de fantasmagorias e animalidades para a a revelação de estados extra-humano
invenção da memória para uma fabulação da língua e da carne
que se move na ficção e na entropia
entre infância e velhice,
passado e futuro,
nascimento e morte




LACRIMAL
Instalação sonora-visual
2022
recomenda-se a escuta
com fone de ouvido.
água, vidro, pássaro, pulso, osso e voz
são os sons e as matérias, vivas e não-vivas, que compõem a obra Lacrimal.
Nos caminhos investigativos dessa proposição, me encontro com a poética e os interesses de pesquisa do artista visual Sérgio Gurgel, para juntos criarmos um ambiente imersivo e ficcional que move devires, fantasmagorias e animalidades de potenciais extra-humano entre corpos e espécies.
A obra se constrói no espaço como um vale de lágrimas, e estampa nos vidros, nos espelhos, nas paredes e nos sons, estados e temporalidades para inventar a memória de um corpo que vibra em esfera aquática amniótica, outras pulsões e modos de existência.
Num jogo marcado pela variação de luzes e sombras, o trabalho explora a técnica de gravura em vidro; o estudo de projeções através refrações e reflexos de iconografias; espacialização acústica; e manifestações fônicas do corpo através de gestos e sonoridades vocais. A obra esteve exposta na 73a edição do Salão de Abril e apresenta um tríptico montado por um busto e três aquários de vidro com desenhos gravados na sua parte externa, contendo água em seu interior. Em sua visualidade expositiva, o tríptico é suspenso por estruturas de fios de aço no teto, imprimindo um estado de levitação em posições assimétricas. Além dos aquários, a obra também é composta por pequenas lanternas que se configuram como iluminação responsável por redimensionar os múltiplos recortes e camadas das figuras gravadas nos objetos projetadas na sala de exposição.
O percurso sonoro em Lacrimal apresenta uma duração aproximada de
40 minutos, e se constrói na reunião de registros e sonoridades diversas,
gravadas e captadas para montar um gráfico de múltiplas camadas e desenho espacializado com tratamento em 5.1. Em suas texturas sonoras,
há registros de aves, de objetos em vidro e de manifestações sônicas do corpo humano como variações rítmicas de pulsos e sons de baixa frequência,
áudios originais de fluidos amnióticos e de articulações ósseas, e sonoridades vocais. A musicalidade que as vozes compõem na obra transita entre vocalizações improvisadas que se desenham em caráter pré-semântico e expressões de choro, riso e grito que juntas foram uma tríade para a construção de um clímax no percurso.
L A C R I M A L
Ficha técnica
Concepção, criação e montagem: Loreta Dialla e Sérgio Gurgel
Pesquisa e design de som: Loreta Dialla
Sonoridades vocais: Dona Valneide e Loreta Dialla
Objetos e gravuras em vidro: Sérgio Gurgel
Master e especialização de som: Clau Aniz
Marcenaria: Oficina Oginn
Parceria: Atelier Rural
Agradecimentos: Alexandre Veras, Beatriz Furtado, Cozilos Vitor, Cícero de Paulo, Deborah Firmeza, Dona Valneide, Estúdio Caixa de Fósforo, Giovana de Paula, Lucas Coelho e Marco Rudolf.